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O novo jeito de ser estivador

  • estivasantos
  • 2 de fev.
  • 3 min de leitura

Não foi apenas a infraestrutura do Porto de Santos que passou por um processo de transformação durante os últimos 133 anos. Os trabalhadores também foram impactados pelas mudanças, tanto tecnológicas como até mesmo do tipo de carga operada. Animais utilizados em espetáculos circenses, africanos escondidos em meio ao açúcar, acidentes e uma atividade pesada sem a utilização dos modernos equipamentos vistos atualmente. Essa era a realidade de quem escolhia um trabalho na parede de um armazém. Hoje, já não há mais gritos ou carteiras pretas sendo agitadas no ar. Há apenas um aplicativo no celular, sem a necessidade de sair de casa para saber o local onde exercerá uma das atividades disponíveis.


"Já tivemos trabalho de descarga de animais, de avestruz, embarque de gados. Há muito tempo, quando os circos, como o Orlando Orfei, podiam utilizar animais, eles vinham por Santos. Havia leões e outros tipos. Também já fizemos a descarga de helicóptero. Além disso, na época, tínhamos muita carga que era manipulada, não vinha em contêineres, peças, produtos que eram acondicionados nos porões para serem embarcados e descarregados. Com isso, o trabalho era muito mais perigoso. Muitos navios antigos não tinham equipamentos de movimentação em boas condições e alguns acidentes eram fatais", relembrou João de Jesus Filho de 66 anos, que atua como estivador há 41 anos.


Apesar de sua atuação estar voltada, sobretudo, a área de segurança, sendo, inclusive, representante da estiva na Comissão de Prevenção de Acidentes do Trabalho Portuário (CPATP), Filho nunca deixou de trabalhar na área de movimentação de cargas, tendo acompanhando de perto os avanços, mas sem esquecer das vivências passadas. Ele aproveita para explicar que o estivador pode ter diferentes funções, como contramestre, responsável por uma equipe de trabalho no navio; geral, que comanda toda a equipe; e operador de equipamento.


"Quando o trabalhador entra no quadro da estiva, ele não precisa ficar restrito. Se tiver habilidade, pode se preparar, se qualificar, fazer cursos por meio do ensino profissional marítimo e não se limita ao trabalho braçal", explicou Filho, que ao falar em tecnologia, lembra com detalhes da mudança de escalação da "parede" para aplicativo eletrônico. Segundo ele, foi algo que trouxe praticidade, qualidade de vida e até redução de custos. No entanto, gerou consequências emocionais, pois não há mais os encontros presenciais entre estivadores.


O primeiro sistema de escala eletrônica foi implantado pelo então OGMO Santos em 2006. Já em 2019, a escalação passou a ser feita via aplicativo. Antes desse período, o cais santista tinha locais para que os interessados pudessem se disponibilizar para as vagas abertas pelos terminais.


Os horários também eram estabelecidos, sendo às 6h45, 12h45 e 18h45. Isso significa se deslocar até as paredes, mesmo que fosse necessário "viajar" por duas ou três horas e não ter a oportunidade desejada.


"Houve uma melhora, porque tínhamos que sair de casa sem saber se íamos trabalhar ou não. Agora há mais tranquilidade, podemos sair alimentados, sabendo exatamente onde vamos atuar. Antes, quem demorava duas, três horas para ir e vir, se não conseguisse trabalho de manhã, tinha que ficar no aguardo para as 13 horas, pois não compensava voltar para casa. Foi difícil para o trabalhador entender, pois ele tinha o hábito de ir na parede, rever as pessoas. Hoje ficamos sem ver algumas pessoas por seis meses, um ano", comentou.


Anderson de Freitas, de 48 anos, na estiva desde 1993, é um profissional que decidiu trabalhar com diversos tipos de maquinários, como guincho de bordo, pá carregadeira, trator de esteira empilhadeira etc. Filho de estivador, ele é chamado de Padeiro, apelido herdado do pai. "O Porto está evoluindo e nós não podemos ficar para trás. Temos que estar sempre se aperfeiçoando cada vez mais. De 2001 para cá, houve muitas mudanças nas leis dos portos, tentando de qualquer forma acabar com uma categoria centenária. E hoje estão tentando novamente mexer nas leis e acabar com a nossa exclusividade", disse o trabalhador.


O período da pandemia da covid-19 segue na memória do estivador, cujo filho de 23 anos também está participando do processo seletivo para ingressar na categoria. "Durante a crise sanitária, trabalhamos para o Porto de Santos não parar. Tivemos medo, perdemos amigos, foi muito triste. Tenho o sonho de poder trabalhar junto com meu filho e relembrar como foi lá atrás quando trabalhei ao lado do meu pai, passando todo meu conhecimento adiante. A estiva está no sangue de quem a ama. Tem que ser respeitada, pois não é somente um trabalho e sim um amor incondicional".
































Fonte: A Tribuna

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